quarta-feira, 17 de julho de 2013

O pesadelo

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"Não me recordo de um Presidente, na II República, ter sido criticado com tanta veemência e haver sido objecto de tantos enxovalhos como este dr. Cavaco que nos coube no infortúnio. Pelos vistos e feitos, tem tripudiado sobre a natureza da função, denegrido as características de "independência" constitucionais que jurou defender e resguardar, e tomar atitudes de soba com a displicência de quem não tem satisfações a dar. A sua presença em Belém tem sido assinalada por uma série de disparates, incúrias, pequeninas vinganças, intrigas baratas, aldrabices indolentes como a das falsas escutas. O pobre homem, por lacuna cultural e outras, não está hipotecado aos princípios republicanos que o 25 de Abril reanimou, embora fugazmente. Pertence a outra vigília, a outra aposta, e a um passado vazio de sentido histórico. Não soubemos evitar o triste incidente do seu surgimento, que se tornou uma pavorosa ameaça. Os cavaquinhos que por aí pululam correspondem às debilidades das nossas respostas, à alteração dos sistemas ideológicos e ao facilitismo da "era de acesso."

Houve, no Brasil dos anos 60, século passado, um cómico famoso, o Chacrinha (aliás, homem culto e lido), que dizia: "Eu não estou aqui para explicar; estou aqui para complicar." O epítome pode, e deve, ser aplicado ao dr. Cavaco. Nada, ou pouco mais do que nada, se lhe pode aduzir, politicamente, em seu abono. Onde toca, dificulta ou emaranha. A bizarria de criar um "compromisso de salvação nacional" que envolve três partidos e exclui outros três alimenta, ainda mais, as divisões na sociedade portuguesa e não soluciona nenhuma questão. O que, retoricamente, separa o PS do PSD e do CDS parece, no momento, irreparável. Seguro quer, nos diálogos, a presença de todos; porém, o PCP, e explica as razões, "não tem nada a ver com aquilo." Os dados estão, à partida, viciados, e a manobra resulta numa piada de mau gosto. E Seguro envolve-se numa ambiguidade grotesca: diz que vai "dialogar" com partidos e não com o Governo, como se aqueles não fossem componentes deste. A confusão acentua-se quando afirma apoiar a moção de censura de "Os Verdes". Entrámos, em definitivo, no reino da feira cabisbaixa.

Ninguém sabe em quem acreditar. Para salvaguarda da nossa saúde mental é melhor, pura e simplesmente, não acreditar em nada. Com perdão da palavra, penso que Seguro está longe da solução adequada, pois pertence ao sistema; mas também penso que é a solução emergente que se arranja. Como dizia o outro, pior do que está, é impossível. Haverá outros caminhos a percorrer, fora deste sistema horroroso de "alternância", que nos leva até ao desgosto de tudo. Mas a organização das "democracias ocidentais" impede a mudança, porque isso conduziria a uma substancial alteração do próprio capitalismo. Todavia, esta impossibilidade aparente não significa que nos resignemos. Capitular é deixar de ser. "(Baptista-Bastos - DN)


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