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Manuel Carvalho da SilvaNesta quadra de Natal e fim de ano, sem deixarmos de ser
realistas e objectivos na análise dos tempos que vivemos,
até porque o binómio individualismo/consumismo não
desapareceu da sociedade, impõe-se um esforço acrescido
na busca de mensagens positivas.
Tenho para mim que, perante grandes dificuldades, a atitude
construtiva e eficaz que um ser humano pode assumir é olhar
os problemas com determinação e rigor, não desistir da vida
(nunca) e decidir avançar para o combate com coragem,
sacudindo medos e resignações, disposto a vencer. E, quando
os problemas são de todos, é por esse caminho que se faz
despertar a "alma colectiva" que impulsiona o avanço da sociedade.
A sujeição amorfa, o aprisionamento dos temores, o imobilismo
do susto, jamais contribuíram para as respostas necessárias em
momento difícil e muito menos podem ser forma de viver
prolongado na expectativa de que desses estados de vida
emanará um novo impulso de progresso. No caminhar das
sociedades, quando se foi por aí sempre correu mal, por vezes
muito mal.
Estamos a viver o que o meu amigo e prestigiado sociólogo
António Casimiro Ferreira (ACF) chama de sociedade da
"austerização" caracterizando-a por, entre outros aspectos,
os poderes dominantes (em regra não eleitos) e os governos
ao seu serviço, buscarem a legitimidade e credenciação das
suas políticas violentas nas inevitabilidades, na exploração
dos medos e resignações inerentes à "não existência de
alternativas", na emergência da mentira, na imposição de
conceitos e mitos manipulados, na inculcação da negação do futuro.
Nesse processo assistimos à desconstrução do valor do trabalho,
do direito do trabalho, da cidadania, que agora nos é apresentada,
criminosamente, como a resultante de um conjunto de produtos
que se adquirem no mercado e debaixo das regras do mercado.
E, para estas governações neoliberais e retrógradas, a estrutura
e funções do Estado também se podem contratualizar no mercado.
Quando as políticas em curso nos afundam na recessão económica
e no empobrecimento a pique, quando o que está delineado pelo
Governo no plano social e laboral nos conduz à pobreza (também
porque nos roubam o acesso à saúde, ao ensino, à protecção social
ou à justiça), quando nos querem impor mais 30 dias de trabalho
por ano sem receber e a abdicar de 2 a 3 salários, quando o impacto
dessas políticas pode provocar o desemprego de mais 200 mil
trabalhadores e trabalhadoras num espaço muito curto, não pode
haver hesitações: é preciso, com confiança, ir à luta e construir
na sociedade denominadores comuns que afirmem caminhos
alternativos de políticas e de governação.
O professor Jorge Leite, provavelmente o mais sólido jurista
português que se debruça sobre o trabalho, refere, a propósito da
tentativa de aumento do horário de trabalho em mais 2,5 horas
por semana, que tal objectivo se configura como trabalho forçado
ou novo "imposto", espécie de reposição da corveia da sociedade
medieval. Corveia significa "Trabalho ou serviço gratuito que o
servo devia prestar ao suserano".
Como diz ACF é preciso afirmar a ética da indignação. Os
trabalhadores e povo português vão ser capazes de dar a volta
à situação e ganhar o futuro!
Como ser humano (cidadão) empenhado na sociedade, que sente
o presente do seu país carregado de expressões de malvadez e
perigos, e também de desafios (num contexto de descalabros a
nível europeu e global), mas que ao longo da sua vida já viu e
participou numa excepcional transformação social e política que
tantos sonhos individuais e colectivos concretizou, desejo para
2012 que:
- os portugueses não cedam ao medo e à resignação e, em vez de
prepararem o kit da emigração, se mobilizem e lutem pelos seus
direitos e pelo futuro do seu país;
- os jovens afirmem, com determinação, não aceitarem uma vida
pior que a dos seus pais ou avós;
- avance a luta contra a pobreza, a injustiça e as desigualdades,
pela dignidade e pela solidariedade, pela soberania dos povos e
países, pois assim poderemos evitar grandes catástrofes ou
guerras.(
Jornal de Notícias)
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