Manuel António Pina
Quem, como eu e a generalidade dos portugueses, não percebe nada de Finanças
nem consta que tenha biblioteca e ouve repetidamente dizer, ao fim de um ano de
inauditos sacrifícios, desemprego, miséria e fome, que "estamos no bom caminho",
acabando por descobrir que afinal, em Março, a dívida pública portuguesa cresceu
mais 26 mil milhões em relação a Março de 2011 (reinava então Sócrates,
cognominado pelo actual Governo de "o Gastador"), perguntar-se-á legitimamente
onde irá dar o "bom caminho".
Mas talvez, quem sabe?, seja assim que se combate a dívida, aumentando a dívida.
Como o desemprego se combate facilitando e embaratecendo os despedimentos e
destruindo emprego.
Dir-se-á que nem eu nem os portugueses mais pobres cuja existência tem sido imolada
no altar da dívida, somos economistas, do mesmo modo que o menino que não conseguiu
ver a fatiota invisível do Rei e gritou "O Rei vai nu" não era, obviamente, alfaiate. Mas
quem escute as homilias diárias dos alfaiates da política de austeridade demonstrando,
mediante equações só acessíveis a pessoas inteligentíssimas e com vastas bibliotecas,
que "não há alternativa", esperaria ver o Rei, já não digo com sapatos novos, mas ao
menos um pouco mais apresentáveis do que há um ano.
Sobretudo depois de, em Janeiro, o alfaiate-mor ter anunciado no Parlamento que 2012
seria o "ano de viragem económica para o país".(Jornal de Notícias)
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