sábado, 13 de setembro de 2014

Partidos: modo de usar

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"Depois de trair os seus eleitores nas eleições de 25 de maio, António Marinho e Pinto, futuro ex-eurodeputado, decidiu fazer o mesmo ao Movimento Partido da Terra (MPT), a força política que "escolheu" para lhe garantir a entrada no Parlamento de Estrasburgo. Nada que surpreenda. Marinho e Pinto é assim, um oportunista encartado.
Oportunista porque, aproveitando a onda de descrença dos cidadãos no sistema político e partidário, se apresenta com um discurso salvífico, justiceiro e ungido de uma pretensa moral antipolíticos, que, em tempos de profunda crise económica e social, sabe ser terreno fértil para a sua pregação. Oportunista também porque, depois de se ter revelado um político igual a todos aqueles que ataca, não hesita em usar de forma despudorada a demagogia e o populismo, para, através das suas intervenções públicas, criar um exército de descamisados que, porque frágeis e desesperados, se deixam cair no logro do verbo fácil da personagem. Oportunista ainda porque, sem qualquer pudor ou vergonha, usa e descarta com a maior das facilidades - a relação "contratual" durou apenas nove meses - um partido, apesar de os abjurar, para conseguir chegar ao pote das mordomias de Bruxelas. Oportunista, por fim, porque mesmo diabolizando as tais mordomias e um salário de "muito dinheiro" - palavras do próprio - não abdica dele porque, mais uma vez palavras do próprio, não é rico e precisa de viver.
É este modelo de virtudes e credibilidade, paladino da ética, defensor dos fracos e oprimidos, que agora se propõe criar o seu próprio partido, diz que de matriz republicana, para nos pedir um voto que lhe sirva de trampolim para entrar no Parlamento nacional, já em 2015. Já sabemos, por antecipação, que a intenção não é sequer aquecer o lugar. Marinho e Pinto, honra lhe seja pela franqueza e a frontalidade, já disse que quer ser ministro, da Saúde ou de outra coisa qualquer. Não interessa se num governo do PS ou do PSD. O que é que importa? Desde que seja tratado por senhor ministro, há de ser-lhe indiferente. Mas também não será coisa para durar, já que o objetivo maior, já o sabemos, é chegar a Belém em 2016.
O fenómeno Marinho e Pinto é produto da notoriedade que também foi construindo, ao longo dos últimos anos, com a sua participação nos exigentes programas da manhã das televisões generalistas. Ele sabe, melhor do que ninguém, que o seu mercado eleitoral é aquele. O dos desocupados, desempregados desesperados por uma oportunidade, pensionistas castigados pelo Estado em quem já não confiam, que olham para a classe política - tantas e tantas vezes por culpa própria, diga-se - como um bando de vigaristas.
Não deixa, porém, de ser extraordinário que o agora novo ícone do protesto seja alguém que se destacou como um defensor à outrance de José Sócrates, qual Belzebu, o ex-primeiro-ministro alcandorado em culpado disto tudo.
De Marinho e Pinto conhecemos ainda as suas posições conservadoras em matéria de costumes, o que num país como o nosso, retrógrado e atrasado, é música celestial para os ouvidos do taxista que há dentro de cada um de nós. É contra o casamento gay, a adoção ou a coadoção por pessoas do mesmo sexo. Presumo que a procriação medicamente assistida seja algo que também não lhe agrade, já que foge àquilo que é "natural". No entanto, e à luz do que assistimos nesta semana na sua relação com o "descartável" MPT, talvez nos surpreenda agora com uma posição mais benevolente - e obviamente inesperada - sobre as barrigas de aluguer. Sim, porque Marinho e Pinto é, como se vê, homem de convicções fortes.
É por isso que repito aquilo que aqui escrevi há umas semanas: em 2015, não se esqueçam de votar outra vez em Marinho e Pinto. E depois não digam que não avisei, mesmo que com ironia."
(Nuno Saraiva - Diário de Notícias)


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