segunda-feira, 19 de julho de 2010

Uma noite há nove meses

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Manuel António Pina
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Quando, há um ano, Sócrates, já em campanha, prometeu que
o seu Governo abriria uma conta de 200 euros para cada bebé,
um estremecimento erótico (toda a gente sabe que o dinheiro é
o melhor e mais lubrificante amigo dos amantes) percorreu o
país do Minho ao Algarve (ou "Allgarve" ou lá como aquilo se
chama agora). E, na noite eleitoral, mal se confirmou a vitória do
PS, desligaram-se os aparelhos de televisão e apagaram-se as
luzes da sala de jantar em milhares de lares, começando a chiar
por todo o lado as molas dos colchões. Os portugueses metiam-se
afanosamente ao trabalho, entusiasmados com a ideia de terem
um filho rico. Afinal foi trabalho em vão e mais lhes valia ter ficado
a ver a telenovela. O Governo, pela voz do ministro da Presidência
e das más notícias, acaba de anunciar que a medida será "recalendarizada",
o que, em português comum, significa que a palavra-chave da tal "Conta
Poupança Futuro" era "futuro" e não "conta" ou "poupança". Uma coisa é
certa: a geração do "baby-boom" resultante daquela noite histórica será
mais céptica em relação a promessas eleitorais que a dos pais.
(Jornal de Notícias)
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1 comentário:

Marreta disse...

Esperemos que seja mais céptica, ou pelo menos mais esclarecida.

Saudações do Marreta.