Arquivamentos na RepúblicaDo
comunicado da PGR de hoje, sobre o Inquérito à licenciatura de José Sócrates:“29 diligências, das quais 27 inquirições, duas buscas e recolha de variada documentação proveniente da Câmara Municipal da Covilhã, Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, Instituto Superior de Engenharia de Lisboa, Direcção-Geral do Ensino Superior, Inspecção-Geral do Ensino Superior e Ordem dos Engenheiros" , para chegar a uma conclusão: arquive-se, nos termos do artº 277 º2 do C.P.P.
No dia 11 de Abril de 2007, José Sócrates chegou às instalações da RTP1, numa comitiva de cinco carros de Estado, com o estadão de primeiro-ministro, com assessores e seguranças, para responder a perguntas de dois jornalistas, sobre dois anos de governo. A entrevista, no entanto e como se previra, centrou-se no assunto relevante da sua licenciatura, cujas dúvidas José Sócrates admitiu então serem legítimas, depois de apodar de caluniadores quem as levantou em primeiro lugar, particularmente nos blogs ( hoje, já depois de conhecido este comunicado,
voltou a apodar de caluniadores os que colocaram dúvidas sobre o seu percurso académico e retomou a tese da campanha ). A este propósito, importaria esclarecer que o que o DCIAP fez e faz, é apenas investigar a prática de crimes. Há outros aspectos de relevância importante, no caso concreto que nada têm a ver com responsabilidade criminal, mas com a pura e simples vergonha ou com a ética política e pessoal, se se quiser. Há perguntas cuja resposta não está dada e que o Inquérito em causa, certamente não dá nem deve dar. Por exemplo, como é que se compreende que haja dois documentos na A.R, fotocópias, um deles rasurado, sobre habilitações literárias, sem que se tenha descoberto o original? Há resposta cabal e decente para isto, há? Enfim.
Durante semanas, um silêncio ensurdecedor, adensou dúvidas sobre a correcção na obtenção dessa licenciatura, levantadas em primeira mão, por
António Balbino Caldeira e desenvolvidas pelo Público.
Na entrevista, dois pormenores, entre vários, mereceram atenção de quem esteve atento.
O primeiro, na altura em que José Sócrates na RTP1 mostrou um papel, supostamente um certificado de licenciatura, emitido pela Universidade Independente, em Agosto de 1996. Este documento, mostrado na altura por José Sócrates, serviu para demonstrar que afinal a sua data de licenciatura tinha sido em 8 de Agosto de 1996 e não, como se dissera e glosara jocosamente por esse país fora, num Domingo de Setembro desse ano.
Dias depois, a TVI noticia que afinal, existia um documento, ( seria o mostrado por José Sócrates, na RTP1, com evidente relevância jurídica?) que fora usado posteriormente (em 2000?), para reclassificação profissional naquela Câmara, pelo mesmo, e era apócrifo, pois continha dados posteriores à suposta data de emissão e que demonstravam contradição com outros existentes.
Afinal, José Sócrates, através do seu gabinete de primeiro-ministro (?) , perante esse novo dado de facto, deu o dito por não dito e voltou à data jocosa, como sendo a da sua verdadeira licenciatura: o Domingo, dia 8 de Setembro de 1996.
Foi este assunto que agora foi investigado pelo DCIAP. O comunicado de hoje é taxativo:
“Da análise conjugada de todos os elementos de prova
carreados para os autos, resultou não se ter verificado a prática do crime de falsificação de documento autêntico (...), na modalidade de falsidade de documento, ou de crime de uso de documento autêntico falso, envolvendo a licenciatura em Engenharia Civil de José Sócrates”.
Das duas, uma: ou o documento mostrado por José Sócrates na RTP1 é verdadeiro, autêntico, não apócrifo e atestado válido que a licenciatura em engenharia civil ocorreu no dia 8 de Agosto de 1996 e isso foi devidamente apurado através das 29 diligências realizadas, ou não é, como o gabinete do primeiro-ministro acabou por reconhecer.
Além disso, se o documento mostrado na RTP1, for o certificado apócrifo, implicitamente reconhecido como falso pelo primeiro-ministro, e se for esse o apresentado na Câmara da Covilhã em devido tempo, continua a dúvida sobre a natureza e relevância das investigações do DCIAP. Afinal , o que é que se investigou mesmo? O documento mostrado por José Sócrates era verdadeiro ou não? E o seu detentor, sabia ou não desse pormenor juridicamente relevante?
Atenta a natureza do assunto, supõe-se que será legítimo perguntar e saber como se fizeram as investigações, para que não ofereça qualquer dúvida mínima acerca do modo como se faz investigação criminal em Portugal, neste como noutros casos.
Esse é o primeiro aspecto que merece consideração, sobre o processo agora arquivado.
O segundo, ligado a este, por motivos óbvios e que deveria igualmente ter sido averiguado, supondo-se que o terá sido, tem ainda a ver com datas, coincidências e amizades perigosas. O percurso académico de José Sócrates no seu núcleo central, encontra sempre um nome no caminho: António José Morais, o professor do ISEL que acompanhou a transferência de José Sócrates para a UNI; que lhe fez o plano das equivalências e que o acompanhou já como docente nessa universidade, nas quatro das cinco cadeiras para a licenciatura, responsável por isso pela aprovação nessas cadeiras esseciais e fulcrais para a licenciatura. Morais, em Março de 1996 fora nomeado por Armando Vara, director do GEPI, um organismo do Estado que acabou envolvido em negócios com uma empresa de consultadoria de que Morais…chegara a ser sócio.
À parte o pormenor esquisito de José Sócrates em declarações publicitadas pelo Público, ter referido inicialmente que não se recordava dos seus professores na UnI, subsiste ainda outra questão básica e central, ainda não esclarecida: José Sócrates disse, para toda a gente ver e ouvir, na RTP1, em 11.4.2007, que apenas conheceu António José Morais, enquanto seu professor. Nem esclareceu que tinha sido no ISEL e ficou a impressão que fora apenas na UnI. Portanto, para registo futuro, ficou a afirmação de José Sócrates de que só conheceu António J. Morais, enquanto seu aluno. O mesmo António J. Morais, confirmou tal facto , numa entrevista ao Diário de Notícias de 22 de Abril de 2007.Agora só falta saber se isto é verdade e se de facto, José Sócrates disse a verdade. Disse? Apurou-se? Se este assunto não foi abordado, ponderado ou investigado minimamente, resta ainda uma conclusão: a investigação criminal em Portugal, relativamente a certos assuntos, continua na mesma. Arquive-se, portanto.
In GRANDE LOJA DO QUEIJO LIMIANO, 01-10-07