1 Segundo o Jornal de Notícias, Rui Rio foi convidado para presidir a uma nova entidade pública chamada Banco de Fomento. Não aceitou. Não se sabe bem se terá rejeitado em função do seu possível futuro político no PSD ou por não querer aparecer colado a uma governação de que tem manifestamente discordado. Ou pelas duas.
As razões de Rio são aceitáveis, elogiáveis até. Embora seja quase constrangedor ter de elogiar alguém por não aceitar convites extremamente bem remunerados porque não concorda com as linhas gerais do Governo, mas é este o infeliz estado do País. E nem vale a pena pensar nas pessoas que aceitam cargos não concordando com as políticas governamentais e tendo mesmo desprezo intelectual por quem os convida. Mas nestes casos o estado do País pouco conta, o carácter das pessoas é tudo.
Por outro lado, seria bem mais importante saber o que pensa o antigo presidente da Câmara do Porto sobre o facto de o Estado ser proprietário de mais um banco ou interferir ainda mais na economia - sendo esta entidade digna de uma república socialista ou do Estado Novo. O que realmente importa, o que precisamos mesmo de saber é o que um político pensa sobre a maneira como se organiza a comunidade e quais as funções que o Estado deve desempenhar. Isso é incomparavelmente mais importante do que saber se aceita ou não um cargo também por uma questão de futuro político partidário, seja lá o que isso for.
Estamos cansados de assistir a jogos florais de que este convite a Rui Rio é um excelente exemplo. Passos Coelho devia estar mais preocupado com o País e menos com os eventuais candidatos à liderança do seu partido. Ninguém pode acreditar que agradasse ao primeiro-ministro - tendo em conta acontecimentos recentes e menos recentes, que só não se lembra quem não tem memória ou não quer ter - que Rio presidisse ao que quer que fosse. Assim como ninguém pode conceber que Passos Coelho pense que o ex-presidente da câmara fosse dirigir de forma competente, opinião dele, essa entidade. Nada disso. No fundo, o que Passos Coelho está a fazer é a trocar as suas próprias convicções, o que realmente pensa ser o melhor para o País, por uma tentativa de afastar um putativo candidato à sua liderança oferecendo-lhe um cargo importante. Eis um exemplo gigantesco de como se olha para o poder como um fim em si mesmo e não como um instrumento.
Ora, nós estamos todos demasiado cansados de políticos que são muito bons em táctica política e que sabem os truques todos para atingir, e manter, o poder, mas que depois não o sabem exercer em função da comunidade e se perdem em jogadas que podem ser tudo menos de política a sério.
Não faço ideia rigorosamente nenhuma se Rui Rio quer ser líder do PSD ou não, se quer, sequer, concorrer eleitoralmente a qualquer cargo público.
Deixou um bom sinal, não aceitando um cargo por discordar de quem o convidou. Mas deixou também um mau sinal ao não aproveitar o ensejo para nos esclarecer quais são de facto as suas convicções sobre alguns aspectos fundamentais para a comunidade, e deixando também a sensação de que estava a embarcar em jogos politiqueiros de que estamos todos fartos. São as convicções, os projectos, o caminho que se quer para a comunidade que realmente contam. São esses que precisamos de conhecer. Sim, é verdade, já houve políticos que nos disseram que acreditavam nisto e naquilo, já nos disseram que iriam neste ou naquele sentido e, afinal, não acreditavam e não foram. Mas não somos infalíveis - e pouco aprendemos com os erros. Seremos mais ou menos vezes enganados. Mas isso nada tem que ver com política: é da vida.
2 O Presidente da República vai solicitar a fiscalização preventiva do Orçamento para 2014. E vai fazê-lo, pela primeira vez na história da democracia, porque também nunca houve na história da nossa democracia um Governo que tão sistematicamente desrespeitasse a Constituição que jurou respeitar. Porque as normas em questão são fulcrais no edifício orçamental que a Assembleia da Republica negligentemente aprovou. Porque, para ele, a estabilidade política é fundamental e Cavaco Silva tem consciência de que um eventual chumbo em Março ou Abril, no meio da execução orçamental e quase no fim do programa seria utilizado pelo Governo - de forma ignóbil, diga-se - como desculpa para se demitir tentando, para além de tudo, fazer do Tribunal Constitucional e do próprio Presidente bodes expiatórios. A serem declaradas agora inconstitucionalidades, ao Governo não restaria outra opção que fazer um novo orçamento e manter-se em funções. Fazer basicamente aquilo para que foi eleito: governar de acordo com a Constituição, fazendo um orçamento que a respeite.(Pedro Marques Lopes - Diário de Notícias)
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